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EMBLEMAS E LEITURA DA IMAGEM SIMBÓLICA NO PALÁCIO NACIONAL DE MAFRA – O que é o emblema?

O emblema canónico é uma composição tripartida, concomitantemente pictórica e poética, constituída por:

1. Uma imagem, cifra ou figura (Pictura, Imago, Icon ou Symbolon), geralmente xilogravada, denominada Corpo do emblema. Ilustra um conceito, no qual é personificado um vício, uma virtude, ou um preceito moral. Apesar da Pictura constituir o aspecto mais característico da literatura emblemática, muitos autores optaram por prescindir dela (emblemata nuda).

2. Um mote, sentença ou título (Inscriptio, Titulus, Motto ou Lemma), também denominado Alma do emblema, cujo propósito é traduzir sinopticamente o sentido da imagem. A generalidade dos emblematistas compunha os motes destinados às suas próprias obras, apesar de a maioria dos autores preferir tomá-los dos clássicos, dos Padres da Igreja, ou até da Bíblia.

3. Um texto explicativo ou epigrama (Subscriptio, Epigramma ou Declaratio), que entrelaça os sentidos da imagem e do mote. Consta de duas partes: uma em que se descreve a Pictura, e outra em que se declara uma mensagem moral ou um intuito didáctico de aplicação universal (sermão moralizante, por intermédio do qual o emblematista evidencia a sua erudição).

Convém, porém, distinguir o emblema da empresa, género afim do emblema (patente em registos heráldicos, vinhetas, marcas de impressores, ex-libris, etc.), com o qual, de resto, foi, requentemente, confundido aquém-Pirinéus. Com efeito, a empresa é uma figura ou composição engenhosa de uso estrictamente pessoal, regra geral, enigmática e indissociável de mote curto (redigido em latim ou grego) que expõe veladamente uma intenção, desejo ou conduta particular, ao invés do emblema que expressa uma intenção geral. Rafael Bluteau esclarece na perfeição as acepções adequadas a cada um dos conceitos:

Entre Humanistas, Emblema é termo metafórico, porque da significação de ornamentos materiais, passou a significar algum documento moral, que aberto em estampas, ou pintado em quadros, se põe para ornamento das salas, galerias, academias, arcos triunfais, etc. O Emblema tem, como a Divisa, ou Empresa, corpo e alma, a saber figura visível e letra inteligível, porém em muitas coisas difere Emblema de Empresa. 

1. Tanto mais perfeita é a Empresa ou Divisa quanto mais simples e composta de menos figuras. Mas o Emblema admite várias figuras históricas ou fabulosas, materiais ou artificiosas, verdadeiras ou quiméricas; nem exclui, como a Empresa, corpos humanos; mas antes com erudita moralidade às vezes representa um Ganimedes, que sobe, um Dédalo que voa, um Faetonte que cai, etc. 

2. O objecto da Empresa (segundo o seu uso primitivo) é Heróico e Particular. O objectivo do Emblema é um documento geral, concernente ao instituto da vida humana.

3. A Empresa como subtil, engenhosa e rebuçada, usa de letra ambígua e lacónica, que declarando encubra, e encobrindo declare, o que significa. Pelo contrário, o Emblema, como familiar, popular, liso e sincero, clara e difusamente expõe o que ensina.

Finalmente, podem a Empresa e o Emblema ter o mesmo corpo ou figura, mas não a mesma alma ou letra, porque a letra da Empresa há-de ser própria e particular, e a letra do Emblema há-de ser geral e dogmática; e com esta advertência, arrolando a alma, e não o corpo, quero dizer mudando a letra sem mudar a figura poderás fazer da Empresa Emblema e do Emblema Empresa.

     Em suma: o emblema é um instrumento multimédia, cujos contornos simbólicos gozaram de enorme voga em toda a Europa, constituindo-se como fonte privilegiada e instrumento hermenêutico impar no que concerne à evocação e enquadramento filosófico-alegórico de cosmovisões, procedimentos teológicos, retóricos, pedagógicos e estéticos, bem como ao esclarecimento da semântica de sistemas de representação e de programas iconográficos. Face à praticamente inesgotável gama de aplicações do alegorismo emblemático, não admira que muitos emblematistas tenham preferido enveredar pela especialização, concebendo obras versando temas específicos, como o Amor divino e a mística (emblemata sacra), a teologia dogmática (emblemática eucarística e mariana), as divisas e empresas políticas (emblemata regia e politica), a arte da memória, a mitologia, as fábulas, os bestiários, a iconologia, etc.

Fragmento da publicação EMBLEMAS E LEITURA DA IMAGEM SIMBÓLICA NO PALÁCIO NACIONAL DE MAFRA – ESQUISSOS PARA UMA EXPOSIÇÃO VIRTUAL, de Manuel J. Gandra

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